#60 Memórias urbanas de infância
No último episódio da segunda temporada de Bobagens Imperdíveis, podcast da escritora Aline Valek, o tema é jornada, ou sobre se perder e traçar um caminho, sobre labirintos e buscas. Nesse texto lindo que Aline narra, ela propõe também um exercício, o de traçar o mapa das nossas jornadas pessoais. É uma ideia que também aparece no livro Mulheres que Correm com os Lobos, mas ali no sentido de lembrar os momentos da vida em que morremos e renascemos. Eu tenho algumas questões com essa ideia: por um lado, acho bonito e importante que possamos tomar nossa própria história para si, vitórias e fracassos, conquistas e fugas da rota. Por outro lado, penso que quanto mais o tempo passa, mais fácil é cair em vícios, narrar sempre as mesmas histórias, e quem sabe até esquecer ou apagar algo que foi de fato vivido. Pode ser bom exercício voltar às memórias de quando em quando.
Os lugares pelos quais passamos e/ou ficamos podem ajudar a traçar esse mapa. A minha memória de infância é muito urbana, mas na verdade não, eu deveria dizer, talvez, metropolitana, sem muitos registros locais e de vizinhança. Segue uma breve lista de algumas das minhas memórias favoritas.
Pensando nisso, fiquei com muita vontade de conhecer essa parte da história de vocês que me leem.
Então pensei fazer uma futura newsletter com as memórias de vocês, leitores. Que lembranças vocês tem da infância na cidade onde vocês cresceram? Quem se sentir a vontade de compartilhar comigo, pode enviar para luisa.agtg@gmail.com :)
As minhas memórias urbanas de infância preferidas são:
- Passar as tardes no Estação Unibanco, cinema de Botafogo, com meu irmão e minha mãe;
- Enquanto ainda morávamos no Rio, chamávamos Camboinhas de "casa da praia", mesmo antes de lá existir uma casa construída nossa;
- Em seguida, toda a região ocêanica era chamada de "Cafubá", pois era lá que nossa avó morava.
A região oceânica de Niterói é um desses lugares que recebe muitos nomes sobrepostos, e ninguém sabe direito onde começa um e onde termina o outro: Itaipú, Piratininga, Cafubá... Acontece o mesmo no Ingá: Boa Viagem, Gragoatá...;
- Passar as tardes no antigo Off Price Shopping Mall, correndo pelas corredores, com meu irmão e minha mãe;
- Quando éramos criança, nosso pai tinha uma Belina, um carro antigo que tinha um porta-malas gigante. Ele abaixava o banco de trás e colocava um colchão pra que eu e meu irmão pudéssemos fazer o trajeto rio-Camboinhas dormindo conversando. Um dia a gente estava falando demais e resolvemos jogar a brincadeira da vaca amarela. O silêncio reinou até a gente pegar no sono;
- Passar as tardes no no Museu do Índio, na Rua das Palmeiras, com meu irmão e minha mãe;
- Minha mãe não deixou eu andar de ônibus sozinha até lá pelos meus 15, 16 anos. Então eu achava andar de ônibus uma coisa relacionada a independência;
- Passar as tardes no clube do Botafogo, com minha mãe e meu irmão, na época que ele treinava pra ser jogador de futebol;
- Um dos meus passeios preferidos era ir ao dentista, pois na galeria em frente tinha um armarinho, uma loja de cacarecos infinitos de costura que me fascinavam quando eu treinava pra ser estilista;
~ Passar as tardes na livraria Saraiva que ficava no shopping Rio Sul. Foi o início da época em que livrarias começaram a colocar sofás e poltronas e permitir que as pessoas ficassem lá dentro lendo. Minha mãe, meu irmão e eu esperávamos pelo meu pai, que, sem celular e com o trânsito do Rio, nunca sabíamos a que horas chegaria. Minha mãe lia livros inteiros nas tardes em que passamos lá. Eu e meu irmão corríamos pelas estantes, conhecíamos cada uma como a palma da nossa mão, líamos, comíamos e ríamos muito.
- Ir no cinema pra fazer hora antes de ir pra algum lugar ou para esperar alguém chegar. Esse é ainda um dos meus passatempos preferidos. Já vi muitos tesouros de filmes que passavam no meio da tarde ou que eram pouco divulgados assim. O cinema é um dos lugares em que me sinto em casa.
E vocês?
Uma ótima viagem a todos! :)
:Dicas a bordo:
- "Corpo e memória: a mulher no território urbano", pela arquiteta Flávia Prado para o ArchDaily Brasil.
~ 5 contas de artistas para acompanhar no instagram (The New York Times)
~ Poesia como modo de vida: nessa entrevista linda demais, o pessoal do podcast budista Coemergência conversa com André Gravatá, poeta que enxerga e vive a vida e a cidade com poesia
~ E no podcast de literatura da revista 451, conversa com Leonárdo Fróes sobre a inspiração que vem do caminhar
~ "Quando a realidade é surreal, apenas a ficção pode dar sentido a ela": No "The Decameron Projet", o New York Times pediu a escritores que produzissem histórias curtas sobre o momento atual. A do Julian Fuks está linda demais
~ Jovens que frequentam bibliotecas comunitárias resenham seus livros preferidos <3 (Quatro Cinco Um)
~ A TV brasileira comemorou esses dias seus 70 anos de idade e o Braincast fez um episódio que é uma viagem muito gostosa à infância nas décadas de 1980 e 1990.
Até a próxima,
Luísa