A verdade dos materiais
Durante boa parte da história, as pessoas construíam seus abrigos basicamente com madeira, pedra, ferro e vidro (areia), ou seja, materiais que se encontrava na natureza. Misturar cascalho, areia, cal y otras cositas deu origem ao concreto, que já teve uma influência bem grande na construção civil, mas foi só no meio do século XIX que um engenheiro francês desenvolveu o concreto armado, que é quando ele tem varas de ferro no meio pra melhorar sua resistência, e mudou a cara da arquitetura do século XX.
Quando as fábricas e a produção industrial de objetos tomou o espaço dos trabalhos de manufatura, duas coisas aconteceram: de um lado, artistas e artesãos se uniram para aliar seu trabalho à indústria, que deu origens a movimentos como "arts and crafts" (artes e ofícios), "art nouveau" e "art déco"; de outro lado, toda uma geração de arquitetos e construtores se debruçou sobre a produção industrial para resolver os problemas da produção em massa. Naquela época, achava-se que a industrialização poderia ampliar o acesso dos bens e produtos, que eram restritos à burguesia, para chegar também na vida dos trabalhadores (a gente sempre achando que a tecnologia vai salvar a pobreza e democratizar as coisas...)
Com isso, a ornamentação de prédios e objetos foi sendo criticada como um sinal de opulência burguesa e de uma época em que a construção civil urbana era feita para poucos, incompatível com os tempos e necessidades modernas. A "verdade dos materiais" era uma ideia de que a construção não deveria "mascarar" sua estrutura, mas deixar a mostra seus materiais e lógica construtiva já industrializada. Panos de vidro nas fachadas, pilares destacados das paredes, lajes, vigas e alvenarias bem marcadas e formas claram marcaram a linguagem dessa arquitetura. A ideia de deixar o concreto aparente, sem pintura nem outros revestimentos, vai gerar todo um movimento na arquitetura moderna chamado de "brutalismo", pois, por motivos óbvios, as formas pesadas e cruas que essa arquitetura projetou tinham um ar bastante bruto. A imagem de uma arquitetura "pesada", "sólida", "consistente" e outros adjetivos levaram essa abordagem a ser muito usada também em edificações e monumentos de representação pública de autoridade.
No Brasil, é uma dos principais registros que identificam a arquitetura moderna que foi desenvolvida aqui, e mais ainda em São Paulo, onde a engenharia e o desenvolvimento de materiais pautou as escolas de arquitetura em seus anos iniciais - 1950 0 (enquanto no Rio elas foram mais guiadas pelas escolas de belas artes). A foto no início dessa cartinha é da faculdade de arq da usp, projeto de um dos arquitetos mais importantes da história de sp: João Batista Villanova Artigas. Ele projetou não só o prédio como o plano de curso de arquitetura, urbanismo e de design também. É um prédio pouco comum, como vocês podem ver pela foto, não tem portas de entrada, mas os acessos vão se delineando pelos volumes do térreno; também não tem janelas, a não ser paredes de vidro no primeiro andar e nenhuma abertura depois a não ser o teto, uma malha de vidro que cobre o prédio todo. Quem achar um baita prédio feio, eu convido a passar umas horas lá, te levo pra ver a passagem das nuvens mudar a iluminação natural do prédio todo, e o barulho da chuva fazer você achar que está acampando, sem prédio e sem concreto.
Uma ótima viagem a todos! :)
:Dicas a bordo :
~ Um dos meus artistas preferidos no mundo produziu na época do Art Nouveau e está com uma exposição enorme no centro cultural fiesp: se você está ou vem pra são paulo por favor não deixe de ir: Alphonse Mucha
~ Um instagram para divulgar o modernismo socialista
~ Esse ensaio fotográfico no Guardian sobre a arquitetura brutalista na antiga Yugoslavia
~ Você consegue adivinhar que cidades são essas a partir de seu skyline?
~ Como seria São Paulo se projetos de urbanismo tivesses saído do papel
~ Quando o moderno não era um estilo e sim uma causa
Até a próxima,
Luísa