Dos luxos coletivos - parte 2
Times Square, em Nova York, antes e depois do projeto de reestruturação urbana desenvolvido pelo urbanista Jan Gehl em 2009.
"Instead of prioritizing private profit, we need cities that put people’s wellbeing first. That means bringing people closer together so they can benefit from having shops, essential services, people, community spaces, and public luxuries within a reasonable distance so they can enjoy a richer — socially, not monetarily — life. But that also means throwing off this false notion that leaving things to ‘the market’ and allowing people to access them if they can afford them is acceptable. It simply is not, and many of the things currently left to private companies should be brought under public ownership and community control". - Radical Urbanist
Poderia ser óbvio pensar que as cidades são planejadas para a vida em comum - em equilíbrio com os espaços da vida privada. Mas a verdade é que um processo histórico de ganho de dinheiro em cima da terra foi levando o chão da cidade a ser um lugar de disputa, que é vencida normalmente por aqueles que detém o poder. No Brasil (ouso dizer que no mundo ocidental, num geral) o mercado imobiliário tem presença significativa na produção das cidades, tanto através do setor privado quanto com uma influência enorme no setor público, mobilizando quem faz as leis que organizam as construções na cidade.
Por isso, num sistema econômico neoliberal, não são os espaços públicos, de uso comum e coletivo que dão maior lucro e por isso raramente são foco dos investimentos, falando assim de maneira resumida. Como eu dizia na última cartinha, no Brasil a gente é pouco acostumado com a qualificação dos espaços de uso comum e coletivo, muito pq as indústrias da construção civil são das mais poderosas aqui desde sempre. Mesmo assim, de que serve colocar tanta gente morando perto e alimentar uma sociedade que vive tudo de forma privada e individual? Vocês já pararam pra pensar na quantidade de serviços e coisas que a gente poderia com certa simplicidade compartilhar com o vizinho?
Quando morava em Paris, meu prédio era uma residência de artistas e pesquisadores e, apesar de não ter uma cozinha coletiva por andar (mais comum nos prédios de residências estudantis), a lavanderia sim era de todos. Basicamente uma sala com algumas máquinas de lavar e umas poucas de secar. Você levava seu cesto, voltava pra seu apê e pegava as roupas dali uma hora, garanto que não caiu a mão de ninguém por fazer isso. Também tínhamos um grupo no whatsapp onde rolava oferecer uma comida que ia sobrar pq vc ia viajar ou qualquer outro motivo. Móveis, equipamentos, dicas de viagens, favores, ninguém era obrigado a nada e mesmo assim muita coisa boa era trocada por ali.
A Natalia Garcia, do Cidades para pessoas contou em sua entrevista pro Coemergência que foi contratada por uma das maiores empresas administradoras de condomínios em sp para criar um aplicativo que conectasse vizinhos: você ficaria sabendo de todo mundo nos arredores do seu bairro que oferecem serviços e coisas - professor particular, alguém pra passear com os pets, câmera fotográfica, furadeira, sei lá, tudo isso. Enquanto a gente acumula utilidades pouco cotidianas nos nossos - cada vez menores - espaços privados, perdemos a oportunidade de cultivar luxos públicos e também de ganhar com eles.
Uma ótima viagem a todos! :)
:Dicas a bordo :
~ A escolha entre luxos públicos para todos ou luxos privados só pra alguns (The Guardian)
~ A análise desse podcast sobre o filme Parasita
~ 90 mil mapas antigos em alta resolução para download <3
~ Por quê o ônibus, a bicicleta e o elevador são mais o futuro do transporte que o carro automático
~ Por quê o apartamento convencional pra uma família alimenta o patriarcado
Até a próxima,
Luísa