Trem das Onze é uma newsletter sobre a vida urbana e tudo que ela inspira. Da cidade que acorda, da calçada que encontra, da praça que acolhe, do trem que passa. Inscreva-se para receber em seu e-mail textos quase quinzenais.
São 18 horas. À frente, a lua cheia sobre no céu por sobre as montanhas de Niterói. Não são montanhas tão grandes como as que dá pra ver da ponte, voltando pro Rio. Mas também são contínuas, formando um contorno para o céu antes de encontrar as linhas da cidade. Entre uma curva e outra, a lua aparece, bem baixinha. A praia do Flamengo é côncava, abraça o observador com a Marina da Glória à esquerda e o Pão de Açúcar à direta. É mentira; à esquerda, a Marina está só no mapa, e o mapa é uma ficção para os olhos. A vista cai mesmo na ponte rio Niterói, esconde até o aeroporto Santos Dumont, que só se sabe pelos vôos. É sempre um susto uma surpresa gostosa “olha! está subindo um avião”. Mais alto que a lua entre as nuvens.
São 18:30 horas. O azul fica bem forte, último golpe de luz antes da noite entrar. Do nada, as luzes da orla se acendem. “Que sorte”, eu penso. Elas acendem todo dia à mesma hora? Não sei e não pesquiso, não importa. É o meu momento favorito do dia, quando dia e noite se encontram. A praia do Flamengo é tímida. Não tem grandes quiosques, não tem um grande calçadão, não tem nem mesmo águas propícias para banho, ainda que as pessoas estejam lá. Estão lá nadando, jogando bola, fazendo exercícios na areia, correndo no calçadão. As pessoas correm enquanto puxam o cachorro, as pessoas correm enquanto empurram o carrinho do bebê. No Rio de Janeiro todo mundo é atleta? No horizonte, Niterói também acende. A cidade brilha enquanto perde os seus contornos para a noite. O que acharia Marcovaldo das cidades que só existem no horizonte pelas luzes acesas, brilhando como vaga-lumes?
Dou três passos para trás. A orla ganha ares de parque e me lembro do Ibirapuera. O parque abraça a praia, quase que a esconde. A praia do Flamengo é um ponto cego do turismo do Rio (ainda bem). O parque do aterro tem gramados mais estreitos que largos, tem pistas asfaltadas sinuosas para os ciclistas, tem quadras, bancos e palmeiras. O pôr-do-sol é para trás. A noite chega primeiro no mar e vai, aos poucos, tomando conta do parque. “O aterro é perigoso”, mas antes das 19 horas tem muitas pessoas aqui.
Mais três passos para trás. O parque quer fazer contato com a cidade, mas tem uma cicatriz perene chamada de avenidas. “Perigo!”, os carros estão em alta velocidade. O parque estende tentáculos por sobre as pistas, imaculadas. Por baixo, viadutos, por cima passarelas, ou o contrário? O céu explode em cores, se despede. Azul, lilás, rosa, laranja, amarelo e a montanha. Mais dois passos, acabou meu espaço, preciso olhar pra cidade. Por baixo é escuro, escolho a passarela. No ponto mais alto, um mirante para a avenida. Inspiração em São Paulo? Estico a vista, lá está ele. O pico mais alto, o cristo altivo, redentor, nem os prédios do horizonte conseguiram alcançar.
Entre as pistas de alta velocidade e uma rua que chama Praia (do Flamengo), um canteiro central alargado, por onde os bares não perdem tempo, estendem suas mesas, fazem de orla a beira do que um dia foi mar, e que hoje é mais coisas.
Atravessei de novo, acabou meu percurso. O bairro do Flamengo se agita mais urbano que litorâneo. Ainda assim, numa esquina vende-se água de coco, na outra sorvete. Em algumas calçadas, palmeiras; em outras, chinelos. Eles sabem que depois dos carros tem uma praia.
Uma ótima viagem a todos! :)
:Dicas a bordo:
~ Se você gostou dessa edição, pode gostar dessas outras declarações de amor que fiz ao Rio:
~ Tá todo mundo tentando aceitar o que é bom:
~ Fazer literatura é uma jornada:
Até a próxima!
Luísa
À direita tem as varandinhas do Biarritz 🖤
A nova fase no Rio de Janeiro está te fazendo muito bem! A cidade maravilhosa está aí para nos apaixonarmos de novo e de novo… 🥰