Depois de viver uma tempestade na ilha em que mora, a jornalista norte-americana Anne Helen Petersen tentou de todas as formas cuidar para que a casa dela se tornasse resilitente à eventos climáticos, mas, no fim, o que a ajudou mesmo a superar o medo constante foi conhecer de verdade os vizinhos: “Eu sei exatamente para quem eu ligaria se algo caísse na minha casa, e eu sei quem são as outras duas pessoas para quem eu ligaria se a primeira pessoa não pudesse vir. Eu sei quem tem muletas extras à mão e quem tem treinamento em primeiros socorros e quem poderia dirigir um barco para o continente. Não precisamos ser melhores amigos para estarmos conectados e úteis um ao outro”.
Eu sempre achei que conhecer gente que mora no mesmo bairro que o seu era coisa de cidade do interior, tinha uma conotação negativa, coisa de fofoca, intromissão na vida alheia, cerceamento. Bom mesmo era metrópole, esse lugar cosmopolita, anonimato, a pessoa andar na rua com uma mlancia pendurada no pescoço e ninguém dar a mínima. Aí veio a pandemia e ficou evidente a esquisitisse que é não conhecer absolutamente ninguém que mora no seu prédio. Um dia eu abri a porta do meu apartamento e tinha um raminho pendurado na porta com um saquinho e uns biscoitinhos. Era Domingo da Ramos. Com o tempo, ficou muito claro pra mim o quanto é bom demais morar perto dos seus amigos, tomar um café no bairro sem precisar de grandes combinações, visitar co frequência, ter uma rede por perto com quem contar.
Aquelas igrejas católicas bem antigas e bem grandes, barrocas, escuras e cheios de anjinhos esculpidos em madeira podem não ser as mais convidativas, mas em São Paulo eu sempre achei sensível uma dessas perto da minha casa que tinha um cartaz enorme divulgando um serviço de escuta - pra qualquer um que tivesse precisando. Eu também vi algo parecido no museu Pompido, em Paris. Dentre os vários serviços voltados ao grande público (que iam de debates de cinema a aulas de francês e informática), eu vi um serviço de escuta. Gratuito e sem explicações - apenas um ouvido estranho e aberto com quem contar. Um gesto de acolhimento na energia de indiferença metropolitana?
Quando eu era adolescente eu morava em Niterói, cidade vizinha do Rio que tem cerca de 500 mil habitantes (ou seja, é oficialmente uma cidade média). No falecido Orkut tinha umas comunidades tipo “Niterói é um ovo” e “Niterói tem 3 pessoas: eu, você e aquela que a gente conhece”. Com um bairro principal de “zona sul” e umas três escolas grande de ensino médio, existia a real possibilidade de você encontrar um conhecido quando fosse à padaria comprar um sonho de doce de leite, e por isso a piada geral era de que a cidade era bem pequena. Ah, claro, a proximidade do Rio não deixava barato pra essa comparação.
Mas, por isso, era Niterói uma cidade acolhedora? Não sei dizer. Eu não estudava na escola do meu bairro, não tinha amigas a uma distância percorrível de bicicleta, circulava bastante pro Rio e não tinha essa vivência mais “local” que algumas das minhas amigas tiveram. Isso independe to tamanho da cidade, acho que tem tanto a ver com a cultura local quanto com o esforço que temos que fazer nós mesmos. Tem gente que cultiva isso mesmo em São Paulo, maior cidade da América Latina, ou, claro, em Minas Gerais (<3)
Uma ótima viagem a todos! :)
: Dicas a bordo :
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(*na terceira dessa lista, escrevi um pouco mais sobre isso)
Até a próxima,
Luísa
Adoro seus textos, Luisa! Refreshing!