40m²
1929, Frankfurt, Alemanha. O congresso era de arquitetura moderna e o tema era o mínimo espaço possível para uma pessoa viver. Naquelas décadas a Europa vinha, em sua grande parte, lidando com o aumento da população urbana e a precariedade das casas da classe trabalhadora. Um modelo digno de habitação funcional e confortável era uma busca política.200m²
Se o espaço doméstico era mínimo para as pessoas viverem suas vidas privadas - era também imperativo que uma série de outros apoios coletivos, como lavanderias, refeitórios, creches, espaços para lazer e convívio, para esportes, atividades físicas e etc. Isso também estava nos princípios modernistas discutidos no início do século XX, embora bem menos incorporados à vida contemporânea que os apartamentos pequenos.30m²
A história da mulher que reformou um apartamento inteiro que era alugado e depois não conseguiu morar lá viralizou por vários motivos, mas acho que foi meio esquecido o fato de que ela constatou - tardiamente - que simplesmente não cabia em cerca de trinta metros quadrados. A polêmica foi muito boa basicamente porque todos estavam errados (!); apesar disso, foi triste notar que, por um lado, havia algum sentido em querer deixar bonita a casa que você vai viver, ainda mais em um contexto geracional onde não se compra mais casas, e, por outro, que o problema transborda para um mercado imobiliário que insiste em oferecer vidas domésticas inteiras em um cômodo e meio.75m² - promessa
Era um tamanho básico de um apartamento de dois quartos em cidades grandes brasileiras onde se supunha que uma família habitaria com conforto um cômodo que serviria para comer, relaxar, estudar e conviver mas ainda chamaria “sala”, uma suíte onde a porta do banheiro daria na cabeceira da cama e uma cozinha que passaria à conformação de um corredor. Difícil esperar gosto por cozinhar ou fazer qualquer trabalho de manutenção da vida quando a cozinha é um cômodo de 5m² onde se superpõem geladeira-microondas-fogão e uma prateleira pra guardar 3 potes.
“Pode parecer que uma cozinha mais ou menos é só algo com que você tem que lidar. Mas ter uma cozinha mal ajambrada é muito desestruturante. É uma tarefa cotidiana, que a gente tem oportunidade de realizar várias vezes por dia, e por isso nesses casos vira um improviso constante. Um monte de gente adora falar sobre o prazer de cozinhar, mas pouquíssimas expõem como é difícil sentir todo esse entusiasmo num lugar que não te comporta” -
no Outra Cozinha>100m² - vip
Começaríamos a ver banheiros e cozinhas com janelas e entrada de sol e quartos onde caberia espaço depois da cama e do armário. A sala de estar talvez tivesse um canto generoso para uma mesa de 4 pessoas, quem sabe até 6!. Com muita sorte encontraríamos uma poltrona perto da janela para leitura, de onde cairia uma charmosa jiboia. A cozinha comportaria uma mesa pequena, talvez um balcão e banquetas para refeições rápidas. Para manter o preço acessível, é provável que perdêssemos porteiro, talvez elevador, talvez mercado em um raio de quinhentos metros e, metrô, esse com certeza não estaria no horizonte.
<20m² esporádicos - a não moradia
Microondas no piso, janela do banheiro em cima da pia da cozinha, beliche a 50cm do teto e a justificativa da arquiteta é sempre a mesma - o uso é esporádico. Prédios com acesso separado para pessoas que alugam por curta temporada, a pouca oferta de aluguel migrando para setores mais lucrativos, e eu me pergunto quem vai construir casas para as pessoas de fato morarem. São surpreendentes as manobras de marketing que se vê em São Paulo para convencer o público de que é possível morar em 14m², ainda que perto do metrô, ainda que com lavanderia no prédio, ainda que, ainda que. No fundo todo mundo sabe que as pessoas querem comprar esses imóveis para aluguel de curta temporada e querem morar mesmo onde tenha lugar pra esticar as pernas, cultivar uma planta, guardar uns livros, respirar.
Uma ótima viagem a todos!
:Dicas a bordo:
~ “O que cabe num território?”
~ To bring back the office, bring back lunch
~ Essa curadoria inusitada de coisas pra fazer no centro de São Paulo
~ In the praise of the metro: um podcast curtinho e surpreendente
~ Autenticidade, casa e mercado - excelente reflexão da
~Talvez você também goste de ler:
Até a próxima!
Luísa
Que edição maravilhosa, Luísa!!! Adorei! Eu penso que precisamos ter cada vez mais estes debates, especialmente depois da pandemia quando vemos um boom na busca por apartamentos antigos dado seu tamanho, o que expande também questões acerca de sustentabilidade, retrofit e habitar o centro de grandes cidades.
Amei ver uma menção a um texto meu também :) obrigada!
Já sabia que ia adorar essa edição desde que vi o email chegando 💜 impossível ler sem pensar em toda a minha trajetória de casa e espaços e apertos nos últimos anos. O que apertou meu calcanhar aqui foi a cozinha pequenina, tudo amontoado. O porém desse lugar. Estou num apartamento médio, de dois quartos, nem faço ideia da metragem agora rs, com dois gatos e mais uma humana. É suficiente. Mas escuto o dia todo os barulhos da família do andar de cima, filhos pequenos, primos, gente chegando e saindo. Fica a curiosidade como de se organizaram na mesma planta.