I. Uma paisagista que projeta todas as coisas bonitas que você agradece que existam na cidade para que você possa ter algum contato com a natureza de forma sustentável. Vive na última casa que resistiu no tecido urbano, produz pouco lixo e contribui pra que o planeta continue existindo. Todos os dias ignora sua amiga bióloga que diz o contrário.
II. Uma jovem estudante de arquitetura que vai fazer intercâmbio e não volta. Enamora-se de um italiano, casa logo depois da formatura, tem um filho chamado giuseppe, mora em uma capital histórica, dessas que moderniza prédios de 700 anos pra que ele dê conta da vida contemporânea europeia, e ele dá.
III. Uma escritora que vive ninguém sabe como, mas escreve uma coluna semanal pra revista, da janela do seu apartamento, vendo a neve passar igual um dia viu a carrie fazer. O apartamento no segundo andar tem mais livros do que louças, mas nessa história seus filhos aprenderam a ler antes dos 4 anos.
Na edição passada eu falei da série Os outros, da Globoplay, e tinha um alerta de spoiler. Se você parou de ler e já terminou a série, volta lá pra terminar ;)
IV. Sexta é meu aniversário de 35 anos. E Meu irmão (gêmeo) me disse que 35 anos é a meia-idade eu fiquei em choque. Pra mim, a crise da meia idade sempre foi coisa das pessoas de 50 anos. Talvez porque meu pai, ao completar 50 anos, disse que estava “virando o cabo da boa esperança”, já que dificilmente viveria mais 50. Se isso não é meia-idade não sei mais o que é. Apesar disso, não posso deixar de pensar que é uma idade simbólica; a maioridade já entrou faz tempo, os diplomas se acumularam, os cabelos brancos já se anunciaram, é hora de pronunciar tudo aquilo que já se é. Mas, enquanto isso, penso em tudo aquilo que já não fui e não serei mais, pelo menos não enquanto jovem adulta. Minha cabeça navegou por todas as minhas versões que habitam diferentes multiversos, bem ao estilo “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”. Como no filme, gostaria muito de passear por todas elas, mesmo que só na ficção.
V. Eu teria sido: paleontóloga, paisagista, baterista, cenógrafa, professora de idiomas, tradutora, bailarina, guia turística, diretora de cinema, fotógrafa. Eu teria tido várias irmãs, avós que seriam meus vizinhos e piscina no quintal da minha casa. Minha mãe leria isso e diria que eu já fui coisa demais e eu deveria mesmo é parar de reclamar. Ela teria certa razão, mas ela também sabe que é coisa minha tentar mapear todas as coisas que não são as coisas que de fato estão.
VI. Eu me mudei de casa e/ou cidade 10x, morei com mais de 10 pessoas diferentes, e voltei pro lugar que eu sempre quis morar. Então chega de projetar o passado, e vamos para o próximo passo especulando o futuro.
VII. Eu quero envelhecer numa casa com piso de taco que saiba o valor do tempo tanto quanto eu. Quero poder bancar a manutenção desse piso, das esquadrias de madeira e dos azulejos coloridos que vão enfeitar a cozinha aberta para a entrada da luz do sol. Vou pendurar poemas da Ana Martins Marques nas paredes para que meus filhos saibam honrar as palavras. Quero que meus filhos também saibam que eu existi antes deles, que fui arquiteta e professora, que viajei por aí sem eles e que viajarei por aí com eles. Que depois do doutorado eu fiquei perdidinha tentando descobrir como projetar o futuro, uma ilusão bastante acadêmica. Eu ainda faço planos que sei que talvez não se realizem, porque esse lugar já é bastante confortável pra mim, mas estou tentando desapegar e inventar um futuro novo todo dia, que só cabe naquele dia mesmo.
Uma ótima viagem a todos! :)
:Dicas a bordo:
~ Cadê o minha medalha por conseguir descansar direito? Uma provocação interessante da
~ A Ana Maria Gonçalves, autora da obra-prima “um defeito de cor”, foi entrevistada no Roda Viva! \o/
~ “O que é uma boa vida e porque não temos uma?” - Também gostei muito desse texto da
~ “Sair de casa já é se aventurar” - um dos meus canais preferidos no youtube voltou com essa reflexão sobre as escolhas da vida em meio a muitas risadas gostosas da Maria Flor
Até a próxima!
Luísa
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Aqui na Alemanha é proibido dar parabéns ou celebrar o aniversário antes: da azar. Mas a coincidência é que a minha newsletter de amanhã fala na primeira frase da minha vida aos 35 anos. Foi uma das fases mais legais de todas. Feliz ano! Viva!
Tenho até seu endereço e só agora me dei conta que ainda não havia assinado a newsletter! Me peguei pensando "faz tempo que não recebo nada da Luísa", resolvi checar e me deparei com vários textos não lidos. Perdidinha da silva no Substack haha para começar, parabéns atrasado! Amei refletir contigo sobre as idas e vindas da vida. Fazer aniversário me deixa muito nostálgica, acho que já mencionei em algum texto que para mim o ano só começa depois que completo mais um ano de existência. É uma brecha perfeita para repensar nossas trajetórias e fantasiar sobre o que nos aguarda nos próximos anos. Amei o texto <3